segunda-feira, 23 de março de 2009

Crítica do filme "Bela Noite Para Voar"



A importância de Zelito Viana para o cinema nacional é inegável. Um grande produtor de diversos filmes importantes, incluindo Terra em Transe e O Dragão da Maldade Contra O Santo Guerreiro, ambos de Glauber Rocha, e o documentário Cabra Marcado para Morrer, de Eduardo Coutinho, que levou vinte anos para ficar pronto. Como diretor, Zelito nos deu alguns filmes interessantes, incluindo a cinebiografia de Villa-Lobos, e programas memoráveis como o infantil Xou da Xuxa e os cômico Chico Total e Chico Anysio Show.

Sua última investida no cinema é o longa Bela Noite Para Voar, que Viana escreveu e dirigiu. Infelizmente, o filme não é nem importante, nem interessante, nem memorável.

O filme, que conta com José de Abreu, Mariana Ximenes e Marcos Palmeira no elenco, conta a história de como seriam alguns dias na vida do presidente Juscelino Kubitschek viajando pelo Brasil, passando por diversos pontos políticos antes de chegar a um encontro amoroso com sua amante. Por trás disso, os militares tramam para derrubar o avião do presidente e tomar o poder.

O problema é que o JK de José de Abreu é uma caricatura extremamente superficial, e o ator erra completamente o tom. Ao invés de oferecer uma visão introspectiva de um personagem extremamente interessante, José de Abreu o interpreta como se estivesse em um palco de teatro e não em uma tela de cinema. O cinema pede por detalhes e não exageros, José.

Sempre considerei Mariana Ximenes uma ótima atriz, uma das melhores de sua geração, mas aqui ela simplesmente não tem o que fazer. A personagem da “Princesa”, como Juscelino chama a amante, é raso demais e as cenas em que ela aparece são tão vazias que chegam a ser patéticas. Durante um dia inteiro, tudo o que ela faz é se preparar para a chegada de JK. Durante o filme, vemos ela tomando banho, depois ela escolhendo a roupa, depois ela pondo a roupa. Não existe uma personagem aí! E é um desperdício para o talento de Ximenes.

Quem se sai melhor dos atores, e o único acerto do filme, é Marcos Palmeira, filho de Zelito, no papel de Carlos Lacerda. Ele não exagera e interpreta o personagem histórico com a devida seriedade que ele pede. Pena que foi o único. Depois do filme, pensei que preferia muito mais ter assistido a um filme sobre o Lacerda de Marcos Palmeira do que este filme.

O resto do elenco de apoio, que conta com a participação de antigos membros da Escolinha do Prof. Raimundo que deveriam ter continuado só na nossa lembrança, é péssimo. E a direção da câmera também é catastrófica, tirando toda a carga dramática do filme e tornando-o em uma chanchada da pior qualidade. E o pior é que essa não era a intenção aqui. A falta de dinâmica dos ângulos e movimentos de câmera dão à narrativa uma aparência amadora e sem inspiração.

Esse filme foi uma triste lembrança do que o cinema brasileiro já foi e espero que não volte a ser.

segunda-feira, 9 de março de 2009

Crítica do filme "Watchmen - O Filme"

Eu mal acredito, mas nesse fim de semana eu FINALMENTE assisti um filme adaptado de WATCHMEN!!! (Para entender meu entusiasmo, leia “Quis custodiet ipsos custodes?”, postado em 16/02/09)


Watchmen – O Filme conta a história de um mundo alternativo onde heróis mascarados teriam combatido o crime até serem proibidos de fazê-lo. Mas os vigilantes são lançados de volta à ativa após o assassinato de um deles. Isso superficialmente, de fato, a proposta do filme, assim como da obra inspiradora, é analisar psicologicamente quem seriam essas pessoas dispostas a se fantasiar e sair por aí brigando com bandidos e como eles se relacionam um com os outros e com o mundo ao seu redor.

Eu confesso que, como fã das revistas, estava bastante apreensivo quanto a essa adaptação, uma vez que o texto já havia sido chamado de “infilmável” diversas vezes e eu tinha medo de que Hollywood fosse transformar a trama em mais um filme de ação de superheróis. Mas felizmente isso não aconteceu. Esse é um filme adulto que explora o lado mais negro de como as pessoas agem, uma vez que se consideram superiores ou responsáveis pelas outras. Como traçar limites? Como não se distanciar das demais pessoas? E isso tudo sem perder o suspense da trama.

Primeiro de tudo, vale confirmar que essa é a adaptação mais fiel possível que o livro poderia ter tido. A história foi razoavelmente reduzida, tramas menores e personagens secundários foram cortados, mas a adaptação continua fiel ao conceito original e isso que importa. Seria impossível querer contar tudo que o original conta, isso acabaria prejudicando o filme que já é bastante denso como ficou.

Assim, Watchmen - O Filme pede atenção total da platéia durante suas quase 3 horas, a tela é cheia de detalhe e as personagens estão quase ininterruptamente servindo informação. E o filme não é para o fraco de estômago, braços são decepados, tripas voam pelos ares, pernas são perfuradas por balas, etc. Mas tudo maravilhosamente fotografado por Larry Fong, que também foi o cinematógrafo de 300, e com impecável direção de arte, que marca as diferentes épocas que o filme cobre.

As coisas que parecem ser mais criticadas pela Internet são: a maquiagem para envelhecer os atores, o final que foi modificado, o mau sincronismo da boca do Dr. Manhattan e seu pinto CG balançante. Nenhuma das coisas me incomodou tanto. Tudo bem, em alguns pontos a maquiagem era menos que perfeita, mas ainda assim, cumpriu seu papel e na maioria das vezes muito bem, e quanto a computação gráfica de Dr. Manhattan, não percebi grande falta de sincronismo, e o membro em questão era da mesma cor do fundo! Era visível, mas para alguém se incomodar com aquilo, deveria estar realmente focado naquilo.

A questão do final é mais complicada. Segundo o diretor, Zack Snyder, o final foi modificado porque se permanecesse como nos quadrinhos ele teria que contar toda uma outra história que adicionaria mais uns quinze a vinte minutos no já estourado tempo. Eu gosto do final original, mas tenho minhas dúvidas se funcionaria no cinema. Somos mais permissivos a certas idéias no papel do que vendo “na verdade”. Eu achei que o novo fim foi muito bom.

Patrick Wilson (Dan Dreiberg/Coruja II) mostra mais uma vez que é muito talentoso perfeito para viver o papel daquele cara meio normal, que é bonito, mas não bonito demais. Wilson é perfeito no papel trazendo uma realidade patética ao herói que mente para si mesmo dizendo que não sente falta das noites de heroísmo.

Malin Akerman (Laurie Júpiter/Espectral II) é o elo fraco da corrente. Eu já sabia. Todo mundo sabia. Ela é linda, mas foi a única no elenco que eu gostaria que tivesse feito mais. Por sorte, o papel de Laurie é o de uma menina que nunca passou da fase de “aborrecente”, reclamona e sem muito conteúdo, então Akerman consegue convencer em algumas cenas, mas não espere dela nenhuma interpretação “Streepniana” nas cenas mais emotivas.

Matthew Goode (Adrian Veidt/Ozymandias) foi muito criticado e provavelmente o que os fãs menos aprovaram, mas eu acho que ele trouxe uma verdade para um personagem muito difícil. Me senti mais ligado ao Ozymandias do filme do que eu nunca senti pelo da revista. Goode entende o personagem e dá a ele um ar de estrela de roque, que desfila pela vida olhando para o resto dos seres inferiores que o cercam.

Billy Crudup (Dr. Manhattan/Jon Osterman) aparece pouco no filme em sua própria carne, mas suas feições perfeitamente reproduzidas por computador dão alma ao único herói com superpoderes de Watchmen - O Filme. Eu gostei muito do que Crudup faz aqui, sempre imaginei a voz do Dr. Manhattan como uma voz superpotente e amplificada, mas a voz suave e fraca de Crudup dá ao superherói uma disconectividade de um professor de física com pósdoutorado obrigado a ensinar física quântica a uma turma de primeira série.

Jeffrey Dean Morgan (Eddie Blake/O Comediante) é quem sai desse filme como uma nova estrela. O ator, conhecido apenas da TV, dá uma sensibilidade ao personagem que as
palavras no quadrinho não conseguem. Como você faz para que o público se importe com um personagem que o próprio capitão Nascimento chamaria de fascista, que bate em mulheres, estupra, mata criancinhas? Você chama Morgan para interpretá-lo, pois isso é exatamente o que ele faz aqui. Ele é um homem podre, mas incrivelmente charmoso.

Jackie Earle Haley (Rorschach/Walter Kovacs) é Rorschach. Ele deixa o público sem palavras perante seu retrato do vigilante psicótico que narra a maior parte da história. Haley faz o maior fã de Watchmen acreditar que Dave Gibbons ilustrou o personagem pensando nele vinte e dois anos depois, da maneira como ele toma esse personagem. Sem dúvida esse trabalho firmará a carreira do antigo ator infantil como um grande ator de personagens. As cenas mais memoráveis e aplaudidas do filme se dão quando Haley, enlouquecidamente, grita pela seu rosto, após a polícia ter arrancado a máscara de Rorschach; quando ele professa a fala tirada da própria revista avisando os outros detentos “eu não estou preso aqui com vocês, vocês estão presos aqui comigo!”, e quando ele vai ao banheiro atrás da Grande Figura. Memorável.

Se tem uma coisa que eu não estou 100% certo quanto ao filme é a trilha sonora. Acho que em certas músicas Snyder acertou em cheio, como é o caso de “Times They Are A-Changing” de Bob Dylan na abertura do filme, de "Unforgettable" de Nat King Cole durante a execução do Comediante, ou de “All Above The Watchtower” do mesmo Dylan, mas na versão de Jimi Hendrix marcando com perfeição o início do terceiro ato. Por outro lado, “Sound of Silence” de Simon & Garfunkel na cena do enterro e “Hallelujah”, celebrando o coito aéreo entre o Coruja e Espectral, parecem extremamente piegas e dão ar de filme de YouTube ao longa. E ninguém mais deveria usar “Pirate Jenny” sob uma cena no Vietnã, acho que se “Hallelujah” e “Pirate Jenny” tivessem sido trocadas de lugar elas funcionariam melhor.

O motivo que o diretor deu por ter usado a última música na cena do Vietnã é porque um trecho dela aparece no livro original, já que a música menciona a Black Freighter, navio pirata da opereta original, e na revista em quadrinho na qual o filme é baseado existe um personagem que lê uma revista chamada “The Tales of the Black Freighter”, que conta uma história de um náufrago que ultrapassa todos os tipos de desafios para voltar para casa e salvar a mulher e filha de piratas que estão a caminho para matá-las, mas o náufrago acaba acidentalmente matando as duas e depois se uni aos piratas. A história em quadrinhos dentro da história em quadrinhos seria uma crítica direta a ação americana na guerra do Vietnã.

Finalmente, eu assisti ao filme sendo fã da obra original, com um amigo que gosta de quadrinhos, mas nunca leu a obra, e minha namorada que nunca leu quadrinhos. E o filme funciona para todos os públicos. Todavia, não vá ao cinema achando que verá um filme de superheróis qualquer, ou um filme como Batman – O Cavaleiro das Trevas. Não é o caso. Enquanto o último filme do morcegão se esforçava para mostrar como seria um superherói no nosso mundo, Watchmen – O Filme, mostra como o mundo seria caso houvessem superheróis.

terça-feira, 3 de março de 2009

Filmografia de Danny Boyle



Enquanto o grupo especial tomava a Marquês de Sapucaí no domingo, dia 22 de fevereiro, Danny Boyle subia no palco do Kodak Theater, em Los Angeles, para receber o Oscar de Melhor Diretor do ano. E o mundo parou e perguntou, quem é Danny Boyle, mesmo? Afinal, o cineasta britânico é um daqueles que o grande público não lembra o nome, embora seus trabalhos não sejam tão desconhecidos. Seus filmes, no entanto, sempre foram preferidos entre o público cult (ah! odeio essa expressão, mas é a que melhor me serve).

O primeiro filme longa metragem de Boyle foi o favorito cult Cova Rasa, o filme foi adorado pelos críticos e recebeu diversos prêmios, além de ter sido o primeiro grande papel de Ewan McGregor no cinema. A dupla Boyle e McGregor continuou junta por mais duas obras, consecutivamente, Trainspotting, o filme que mostrou como nenhum outro, até então, a geração dos jovens ingleses que viviam de raves, sexo e drogas, e o fantástico Por Uma Vida Menos Ordinária, no qual McGregor faz par romântico com Cameron Diaz, mas são os “anjos” Holly Hunter e Delroy Lindon que roubam a cena. Se você ainda não viu esse filme corra para a locadora.

Hollywood já havia procurado Danny Boyle para que dirigisse o quarto filme da série Alien depois de Trainspotting, mas o diretor negou. Agora era hora dele se aventurar na Meca do cinema industrial. O projeto escolhido foi A Praia, estrelado pela maior estrela do cinema na época, Leonardo DiCaprio. Porém, o filme foi um fracasso de crítica e público. Além de ter sido atacado por ambientalistas, pois a Fox, produtora do filme, teria alterado a paisagem natural da locação para que a praia parecesse mais paradisíaca.

Boyle, então, voltou para a Inglaterra onde filmou dois filmes para a BBC e um curta metragem, Alien Love Triangle. Seu retorno para o cinema comercial foi Extermínio, um filme ficção científica sobre um homem que acorda de um coma em uma Londres tomada por zumbis. O filme de baixo orçamento foi um grande sucesso nas bilheterias mundiais e aclamado pela crítica. Extermínio já gerou uma sequência e uma mais está em fase de préprodução. O filme também lançou o ator Cillian Murphy internacionalmente, ele mais tarde viria a ser o Espantalho de Batman Begins.

Para seguir o terror de Extermínio, Danny Boyle fez um filme inglês para toda a família, Millions foi um grande sucesso de crítica, sendo aclamado um dos melhores do ano, e também de público. E Boyle mudou completamente seu foco, mais uma vez, ao fazer Sunshine, Alerta Solar, um filme que mistura aventura, ficção científica e filme de arte, e o reuniu com o ator Cillian Murphy. O filme foi um fracasso de bilheteria, apesar de ter tido criticas razoavelmente boas.

E depois de Sunshine, Alerta Solar, o cineasta resolveu fazer um filme inglês no país onde mais se produz filmes no mundo, a Índia. Quem Quer Ser um Milionário, baseado no romance “Q&A”, do autor e diplomata indiano Vikas Swarup, virou uma febre no circuito de festivais do ano passado e o grande vencedor dos Oscars desse ano, inclusive o de Melhor Filme e Diretor para Danny Boyle.


Então, esse é Danny Boyle, um cineasta que se manteve afastado de Hollywood, fazendo filmes de humor negro, zumbis e no espaço, teve tantos fracassos quantos sucessos, se manteve um favorito cult e acabou sendo considerado o melhor diretor do ano pela indústria que ele negou.